Investigação portuguesa revela surgimento mosquitos híbridos
Dois tipos de mosquitos com hábitos alimentares diferentes estão a cruzar-se geneticamente em Portugal, aumentando o risco de doenças como a febre do Nilo, devido à probabilidade de picarem aves migratórias e o homem simultaneamente.
As duas formas de mosquitos pertencem ao mesmo grupo, mas vivem tradicionalmente em habitats distintos, uma à superfície, outra em ambiente subterrâneo. Uma alimenta-se em aves e outra no homem.
Só que na Comporta, Alentejo, uma equipa de investigadores portugueses descobriu híbridos, resultantes dessa união.
É a primeira investigação em Portugal sobre este tema, já amplamente estudado nos EUA, e está a cargo de uma equipa multidisciplinar liderada por João Pinto, do Centro de Malária e Doenças Tropicais, do Instituto de Higiene e Medicina Tropical.
«Esta espécie apresenta duas formas, que têm comportamentos diferentes. O mais interessante, a nível médico, é o facto de uma se alimentar preferencialmente por aves (pipiens), que são reservatórios destes vírus», contou o investigador à agência Lusa, acrescentando que a outra forma (molestus) se alimenta essencialmente em mamíferos, entre os quais o homem.
Os investigadores encontraram na Comporta uma taxa de hibridação de 15 por cento e estão já a estudar outras regiões do país.
«O que nos levou a estudar este grupo particular de mosquitos em Portugal foi precisamente o facto de transmitirem algumas doenças e já estarem associados a uma epidemia de febre do Nilo ocidental em larga escala, ocorrida há alguns anos nos EUA», disse o investigador, frisando que em Portugal não há casos, por enquanto, nem se espera qualquer situação de alarme nos próximos tempos.
Porém, a investigação permite obter a informação necessária perante um cenário de combate a esse fenómeno, seja através de insecticidas ou outras medidas.
«Havia muito pouca informação acerca destas populações no Sul da Europa, mas já tínhamos conhecimento da presença da espécie em Portugal», afirmou, recordando dois casos de turistas irlandeses infectados no Algarve, onde acamparam para observar aves.
O especialista conta que as duas formas de mosquitos pertencem à espécie mais comum e estão «mais ou menos isoladas» uma da outra, com vários registos que o atestam.
«No Norte da Europa - onde a forma molestus ocupa habitats subterrâneos - o exemplo mais interessante são os túneis do Metro de Londres, enquanto a outra forma que se alimenta em aves vive à superfície», relata.
A equipa, maioritariamente constituída por biólogos, constatou que ambas as formas vivem juntas e à superfície na Comporta, no mesmo espaço, naquilo a que se designa por «populações simpáticas».
Foi também feito um estudo genético para ver se, estando a coexistir no mesmo espaço, os mosquitos mantinham um grau de diferenciação.
«Verificámos que, apesar de eles estarem a habitar o mesmo espaço, mantêm-se diferenciados. No entanto, encontrámos taxas de hibridação da ordem dos 15 por cento, ou seja, estas formas estão a cruzar genes entre si e isso tem uma importância epidemiológica», acrescentou João Pinto.
A epidemia de febre do Nilo vivida nos Estados Unidos dispersou-se em três/quatro anos por cerca de dois terços do território norte-americano.
A doença pode ser grave, mas nem sempre o é, refere João Pinto, explicando que geralmente causa sintomas febris, mas também pode originar problemas neurológicos graves, nomeadamente no desenvolvimento de meningites e encefalites, que podem resultar em morte.
Diário Digital / Lusa
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